fbpx

Por onde começar a ler a literatura universal?

Quando alguém quer iniciar a leitura dos clássicos da literatura universal é comum seguir sugestões de leitores amigos ou ir a uma livraria e começar a fuçar as prateleiras em busca de alguma obra que lhe pareça boa. O resultado disso é que geralmente se começa a ler literatura de ficção atraído pelo gosto de terceiras pessoas; ou, pior, pela capa, pelo título ou pelo enredo do livro.

Esse não é o melhor modo de começar. Na verdade, não há um único modo correto de começar a ler a literatura universal. Há, porém, boas sugestões que podem orientá-lo na formação da sua própria trajetória de estudos.

Primeira sugestão: antes de escolher que autores você lerá, busque primeiro ter um panorama geral da literatura universal. Para isso, nada melhor que os quatro volumes da História da Literatura Ocidental, do Otto Maria Carpeaux, publicados pela Editora do Senado Federal. O crítico literário Rodrigo Gurgel deu há pouco tempo um curso de comentário, capítulo por capítulo, dessa magnífica obra.

Segunda sugestão: acostume-se a ler a boa crítica literária. Nesse ponto, a editora É Realizações tem feito um trabalho excelente ao lançar autores como Northrop Frye, Lionel Trilling, C. S. Lewis, T. S. Eliot e José Guilherme Merquior. Busque também ler Álvaro Lins, Augusto Meyer, Adolfo Casais Monteiro e o próprio Otto Maria Carpeaux.

Terceira sugestão: tenha bem presente o que a literatura pode fazer por você — em outras palavras: como a literatura pode transformar a sua vida. Sim, pois a literatura não é pura diversão ou passatempo — pelo menos não deveria ser vista assim, como quem diz: “não sei se tomo um sorvete, se vou dar uma volta de carro, se vou assistir ao programa do Luciano Huck ou se finalmente começo a ler A Montanha Mágica, de Thomas Mann”. Saiba que a literatura, ao enriquecer seu imaginário, pode transformá-lo em uma pessoa mais inteligente e mais compreensiva. Tudo isso você verá com maiores detalhes assistindo às aulas dos professores e lendo os autores que tratam adequadamente desse tema. Na minha opinião, os mais claros e, portanto, mais acessíveis ao iniciante são os seguintes:

i) Mario Vargas Llosa — Discurso por ocasião do recebimento do Prêmio Nobel de Literatura em 2010

Esse discurso está transcrito, em português, no site do Estadão.

ii) Prof. Luiz Gonzaga de Carvalho Neto — Palestra: A Importância da Literatura (abertura do curso “A Leitura dos Clássicos”). Dica: esse vídeo abaixo não contém a aula completa, mas sua maior parte; há outro link no YouTube, fora do canal do ICLS, com a íntegra da aula.

iii) Adélia Prado — Palestra no programa Sempre um Papo: O Poder Humanizador da Poesia

Esta palestra foi transcrita, por este que vos fala, e pode ser acessada aqui.

iv) Miguel Sanchez Neto — Seis Teses sobre os Valores da Literatura

v) Conversa do prof. Olavo de Carvalho sobre literatura com o escritor Yuri Vieira:

vi) Gabriel Perissé — Palestra de lançamento do livro Como Educar sua Mente, de Susan Wise Bauer

vii) Alain de Botton — livro Como Proust pode Mudar sua Vida, Ed. Intrínseca

Quarta sugestão: conheça o trabalho do prof. José Monir Nasser, em especial a série de encontros das Expedições pelo Mundo da Cultura. Um modo de fazer isso é acessando às transcrições que o SESI do Paraná fez de alguns dos encontros.

Os comentários do professor sobre as diversas obras que se propôs a comentar são muito ricos e demonstram como a literatura possibilita a integração de praticamente todos os campos do conhecimento e da experiência humana. Trata-se de encontros muito inspiradores que, por isso, podem enriquecer a experiência de leitura. Lamentavelmente o professor faleceu precocemente há alguns anos. Circulam entre ex-alunos insiders e admiradores alguns áudios de suas incríveis palestras.

Caso não consiga acesso às aulas do prof. Monir, pode conhecer um pouco de seu trabalho assistindo às duas palestras que ministrou no Espaço Cultural da É Realizações:

Lançamento do livro Trivium, da Irmã Miriam Joseph:

Lançamento da obra Como ler livros, de Mortimer J. Adler e Charles Van Doren:

Quinta e última sugestão: não caia na tentação de ler os mais vendidos apenas para ter a sensação de estar atualizado. Entenda de uma vez por todas: a moda é ler os bons livros — e a maior parte dos bons livros já está catalogada pela crítica sob o epíteto de clássicos da literatura.

Depois de tudo o que eu disse, uma sugestão de livros específicos é verdadeiramente dispensável. Se você ler boa parte dos livros e assistir a boa parte dos vídeos que indiquei já terá condições de escolher suas leituras por si mesmo. Mas se, ainda assim, você quer algumas indicações iniciais, pode acessar as listas dos melhores livros que coloquei em outro post. Essas listas lhe darão centenas de possibilidades. Então, para facilitar sua vida, sugiro que comece por alguns dos seguintes livros, que considero de média dificuldade:

Literatura universal (baixa ou média dificuldade):

A Morte de Ivan Illich, de Tolstói
Madame Bovary, de Gustave Flaubert
Os Noivos, de Alessandro Manzoni
O Apanhador no Campo de Centeio, de J. D. Salinger
Coleção Maigret, Georges Simenon

Literatura nacional (baixa ou média dificuldade):

Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis
Dom Casmurro, de Machado de Assis
São Bernardo, de Graciliano Ramos
Vidas Secas, de Graciliano Ramos

Depois, faço votos de que você se anime a enfrentar livros que podem oferecer alguma dificuldade, quer pela complexidade da linguagem, quer pelo extensão:

Literatura universal (média ou alta dificuldade):

Dom Quixote, de Miguel de Cervantes
Odisséia, de Homero
Os Irmãos Karamázov, de Fiodor Dostoiévski
Otelo, de William Shakespeare
Atlas Shrugged, de Ayn Rand

Literatura nacional (média ou alta dificuldade):

Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa
Crônica da Casa Assassinada, de Lúcio Cardoso
Ópera dos Mortos, de Autran Dourado

Se preferir, entre em nosso grupo de discussões do Telegram (um aplicativo de troca de mensagens pelo celular). Lá estamos fazendo a leitura comentada de Dom Casmurro, de Machado de Assis.

Bom proveito e boas leituras!

Related Articles

Reparação, de Ian McEwan

Se você está pretendendo ler Reparação, do escritor inglês Ian McEwan, não vá com muita sede ao pote. É um livro bem normalzinho, sem grandes momentos nem grandes sacadas. Eu só o encarei agora porque coloquei na cabeça que deveria, a cada dois dos ‘melhores clássicos da literatura universal de todos os tempos’, ler um livro de literatura brasileira e um de literatura universal contemporânea — os próximos dessa categoria serão Pastoral Americana, de Philip Roth, A Fantástica Vida Breve de Oscar Wao, de Junot Diaz e O Homem que Amava os Cachorros, de Leonardo Padura (afinal, um livro que agradou pessoas tão diferentes como o dr. Emir Sader, Frei Beto e o prof. Olavo de Carvalho merece ser lido com urgência).

Não fiz propriamente uma resenha do livro Reparação, mas deixei no YouTube minhas impressões — que, aliás, não foram as melhores. O vídeo está abaixo. Eu não cheguei…

Um conselho a quem queira fazer literatura de ficção no Brasil hoje (Olavo de Carvalho)

Aluno: Em nosso país, com o atual estado da linguagem, qual lhe parece o grande desafio para quem pretenda fazer literatura de ficção?

Em primeiro lugar, você terá que começar a trabalhar essa linguagem que existe. Deverá pegar esse tecido de chavões, de lugares-comuns, e trabalhar para descobrir o que está no fundo deles e como você pode transformar uma coisa na outra. Não adianta você querer chegar diretamente em uma linguagem mais elevada. Você não conseguirá. Nós sempre temos que trabalhar a língua existente. Eu tenho procurado fazer isso: pegar desde a fala mais vulgar possível e elevá-la quando possível; e, depois, voltar a essa fala vulgar e… Eu não vejo outra maneira de trabalhar isso. Afinal de contas, a não ser que os seus personagens fiquem totalmente inverossímeis, eles terão de falar mais ou menos como as pessoas [comuns] falam. Por outro lado, não há porque limitar o seu padrão de…

ABC da Literatura, de Ezra Pound

O ABC of Reading do poeta e crítico americano Ezra Pound é uma pequena joia à disposição dos que desejam se iniciar no conhecimento da grande literatura universal. A leitura é rápida e muito proveitosa. Ao final há uma coletânea bem interessante de alguns dos grandes poemas de todos os tempos. Na edição brasileira, alguns dos poemas foram publicados na língua inglesa; outros foram traduzidos pela trinca Augusto de Campos, Haroldo de Campos e Décio Pignatari.

https://www.youtube.com/watch?v=qkDBQ7xpAxw

Responses