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Aos iniciantes no estudo da filosofia platônica

Iniciar o estudo da Filosofia Grega é uma aventura que nos recompensa com abundantes frutos. E ninguém se lance a essa empreitada sem ter uma boa experiência literária — antes, pelo menos, de ter lido e absorvido uma centena das melhores obras da literatura imaginativa universal. A sugestão, que tenho seguido, não é minha mas do Prof. Olavo de Carvalho. Os fundamentos da necessidade de enriquecer o imaginário antes de começar a se debruçar sobre obras filosóficas você os encontra na obra do professor (principalmente nas aulas do Curso Online de Filosofia, ainda em andamento).

Superado este ponto, sigamos. Suspeito que o melhor a fazer não seja começar pelo começo. Deixemos Tales de Mileto para um momento posterior. O melhor, parece-me, é começar por Sócrates, que é considerado o ‘pai da Filosofia’ apesar de não ter deixado obra escrita. Depois de compreender relativamente bem o que é o projeto socrático, pode ser interessante ler dois ou três diálogos platônicos menos complexos e, só então, dedicar-se com a mente aberta e a imaginação ativa ao estudo dos pré-socráticos.

Os diálogos platônicos fazem frequentes referências aos pré-socráticos. Alguns deles são diálogos com a filosofia que veio antes (vejam, por exemplo, o diálogo Parmênides, o Górgias e tantos outros). Além disso, Platão foi um dedicado estudioso de seus antecessores. Enfim, querer entender Platão sem conhecer bem os pré-socráticos é como querer entender o Cristianismo sem compreender a História dos Hebreus como relatada no Antigo Testamento. Se tentar ir por essa via e for perseverante, possivelmente entenderá alguma coisa, mas suspeito que essa coisa estará bem distante daquilo que Platão entendia como representativo de sua atividade filosófica.

Adiante. Ninguém se atreva a começar o estudo de Platão pela leitura isolada dos diálogos; e, principalmente, não recuse a companhia dos melhores estudiosos (historiadores e comentadores). Há uma vasta tradição de estudos platônicos que não é possível ignorar. Existe uma enorme distância entre as imagens trabalhadas por Platão em seus diálogos e as imagens com que nós, que vivemos o começo do Século XXI, estamos acostumados a pensar. Se você tentar ler os diálogos platônicos sem o amparo dos comentadores provavelmente achará que está entendendo Platão quando na verdade está apenas trabalhando suas próprias imagens mentais ao som dos ecos vagos das palavras que o diálogo veicula e traz até você. A crítica que Platão faz aos escritos, no Fedro, deve ser suficiente para que nos acautelemos. O logos precisa se explicar. Como Sócrates e Platão não podem fazê-lo diante de nós, diante de nossas dúvidas surgidas aqui e agora, é preciso recorrer aos comentadores que, bem ou mal, buscam explorar diferentes perspectivas de compreensão da filosofia exposta nos diálogos.

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Para começar a ler Platão

É muito bom que você tenha interesse em estudar Platão. Porém, a não ser que você seja um gênio autodidata, pode não ser bom que você comece pela leitura direta (e seca) dos diálogos. Isso porque no começo dos estudos as pessoas não têm habilidade suficiente para compreender o que, raios, está sendo tratado pelos interlocutores. No início, os olhos do estudante são como os olhos de um recém-nascido: só enxergam vultos.

É verdade que em algum ponto de uma vida de estudos o aspirante a filósofo sairá da caverna e terá sua vista ofuscada pelo Sol. Sim, é verdade. Mas para compreender o que é essa luz e como voltar a enxergar aos poucos, é preciso que você já tenha entendido que a vida na caverna, a visão das sombras, não é propriamente uma vida plena; e, principalmente, é necessário que você tenha desenvolvido um desejo firme o suficiente pela luz do Sol. E isso se faz…

Aqueles que falaram a respeito de Sócrates

Preciso falar duas palavras sobre as fontes de acesso a Sócrates. Como ele nunca escreveu uma linha sequer, tudo o que sabemos a seu respeito nos chegou através de terceiros. Se foram fiéis ao chamado Sócrates histórico é questão controversa.

Há basicamente quatro boas fontes para ter acesso à vida e aos ensinamentos de Sócrates: Aristófanes, Xenofonte, Platão e Aristóteles. Sem dúvida, quem nos pintou o retrato mais belo de Sócrates foi Platão. Aristófanes, em sua comédia As Nuvens, retratou um Sócrates jovem, meio sofista, e o fez alvo de zombarias. Parece que foi uma caricatura do primeiro Sócrates. Xenofonte, nos Memoráveis (Ditos e Feitos Memoráveis de Sócrates) e em alguns diálogos menores, descreveu um Sócrates excessivamente preocupado com questões morais – como dizem, o Sócrates de Xenofonte é inofensivo demais e certamente não seria condenado pelo Tribunal ateniense. Logo, trata-se de uma imagem parcial. Além disso, quando Xenofonte escreveu seus livros parece…

Começando a estudar Aristóteles

Um de meus tantos planos para 2017 é iniciar o estudo da filosofia de Aristóteles — ou, como sugere o prof. Olavo de Carvalho: estudar a realidade através das lentes de Aristóteles. Não é uma tarefa fácil, claro; exige perseverança, paciência e um tanto de maturidade. Porém, depois de passar dois anos estudando Platão (seus diálogos e seus principais comentadores) é chegado o momento de enfrentar a mente mais universal dos gregos.

Pretendo anotar, aqui, semana a semana, um breve relatório desse estudo, que, em sua primeira parte, provavelmente durará cerca de cinquenta semanas. É verdade que nem tudo na vida (ou quase nada) se encaixa perfeitamente em nosso planejamento inicial. Porém, planejar é preciso. A primeira etapa desse estudo será a leitura de três obras introdutórias, de pouco fôlego: Aristóteles, de Émile Boutroux, Aristóteles, de Enrico Berti, e Aristóteles Para Todos, de Mortimer J. Adler. Após, mês a mês, irei dedicar-me…

Eutidemo, de Platão (Edith Hamilton)

“Este é talvez, de todos os diálogos platônicos, o que torna a Atenas de Sócrates e de Platão aparentemente mais distante de nós. Nós somos conduzidos de volta a um tempo em que a linguagem havia começado a ter grande importância em si mesma e em que os raciocínios eram geralmente expostos oralmente. Um trocadilho ou um duplo significado podia decidir uma importante discussão. Aqui Sócrates enfrenta Eutidemo e seu irmão, ambos assim chamados erísticos, ou contendores das palavras, e na sua batalha com Sócrates, que diz ser apenas um de seus alunos, esse tipo de artifício ocorre com frequência e se torna extremamente cansativo. Por exemplo, quando Sócrates pergunta pelo sentido de uma frase usada por Dionisiodoro, em resposta ele lhe diz: ‘Há alma nas coisas que têm sentido, quando elas têm sentido? Ou há apenas o sentido das coisas desalmadas?’ Sócrates responde, ‘Apenas as coisas com alma.’…

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