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Poema enjoadinho (Vinícius de Moraes)

Filhos… Filhos?filhos
Melhor não tê-los!
Mas se não os temos
Como sabê-lo?
Se não os temos
Que de consulta
Quanto silêncio
Como os queremos!
Banho de mar
Diz que é um porrete…
Cônjuge voa
Transpõe o espaço
Engole água
Fica salgada
Se iodifica
Depois, que boa
Que morenaço
Que a esposa fica!
Resultado: filho.
E então começa
A aporrinhação:
Cocô está branco
Cocô está preto
Bebe amoníaco
Comeu botão.
Filhos? Filhos…
Melhor não tê-los
Noites de insônia
Cãs prematuras
Prantos convulsos
Meu Deus, salvai-o!
Filhos são o demo!
Melhor não tê-los…
Mas se não os temos
Como sabê-los?
Como saber
Que macieza
Nos seus cabelos
Que cheiro morno
Na sua carne
Que gosto doce
Na sua boca!
Chupam gilete
Bebem shampoo
Ateiam fogo
No quarteirão
Porém, que coisa
Que coisa louca
Que coisa linda
Que os filhos são!

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Uma pergunta (Adélia Prado)

Vede como nossos filhos nos olham,
como nos lançam em rosto
uma conta que ignorávamos.
Não cariciosos, convertem em pura dor
a paixão que os gerou.
Por qual ilusão poderosa
nos veem assim tão maus,
a nós que, tal como eles,
buscamos a mesma mãe,
concha blindada a salvo de predadores.

Primaveras (Casimiro de Abreu)

I

A primavera é a estação dos risos,
Deus fita o mundo com celeste afago,
Tremem as folhas e palpita o lago
Da brisa louca aos amorosos frisos.

Na primavera tudo é viço e gala,
Trinam as aves a canção de amores,
E doce e bela no tapiz das flores
Melhor perfume a violeta exala.

Na primavera tudo é riso e festa,
Brotam aromas do vergel florido,
E o ramo verde de manhã colhido
Enfeita a fronte da aldeã modesta.

A natureza se desperta rindo,
Um hino imenso a criação modula,
Canta a calhandra, a juriti arrula,
O mar é calmo porque o céu é lindo.

Alegre e verde se balança o galho,
Suspira a fonte na linguagem meiga,
Murmura a brisa: – Como é linda a veiga!
Responde a rosa: – Como é doce o orvalho!

Como ler poesia (e para quê): a poesia como alimento para a alma

A maioria dos grandes poetas concorda que os poemas não têm propriamente uma função. Os bons poemas simplesmente são — e isso já lhes basta. Não é possível negar, entretanto, que a poesia pode ser terapêutica na mesma medida em que não tenha a pretensão de sê-lo. Se você acha que a poesia é um mero passatempo para desocupados ou uma válvula de escape para malucos de toda ordem sugiro que repense seus preconceitos e comece a ler a boa poesia. Para ajudá-lo nessa empreitada, eis alguns motivos para você começar a ler poesia (clique sobre os tópicos para acessar os poemas):

Para descobrir onde estão as pessoas com quem você convivia na sua infância

Para entender por que a vida asfixia alguns de nossos “cantos de inocência”

Como decidir entre a psiquiatria e a poesia

Para entender o que é ter vivido…

Hoje: gaiola sem paisagem (Alberto da Costa e Silva)

Nada quis ser, senão menino. Por dentro e por fora, menino.
Por isso, venho de minha vida adulta como quem esfregasse na pureza e na graça o pano sujo dos atos nem sequer vazios, apenas mesquinhos e com frutos sem rumo.
Como se escovar os dentes fosse montar num cavalo e levá-lo a beber água ao riacho! Como se importasse à causa humana ler os jornais do dia!
Era melhor, talvez, ficar olhando, completo, perfeito, os calangos a tomar sol no muro, sem trair o silêncio, sentindo o dia, para conhecer o mundo, para saber que estou vivo.
Se não se têm esses olhos de infantil verdade, todas as cousas nos
enganam, tornam-se as palavras sem carne com que construímos a árida abstração que é o curral dos adultos.
Depois dos quinze anos, quase nada aprendemos: a dar laço em gravatas, por exemplo.

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